Padrões e Crenças
O ser humano foi dotado com a habilidade de identificar padrões. Nossa evolução nos aprimorou com uma capacidade inata de enxergar relações de causa e efeito, até mesmo em padrões complexos. Este sempre foi um mecanismo poderoso de defesa e vantagem, nos permite antecipar o perigo e identificar oportunidades.
Mas essa mesma vantagem, muitas vezes, atinge um limiar perigoso, onde passamos a ver padrões onde eles não existem. Assim, nasceram as superstições: tentativas de explicar o inexplicável a partir da correlação de determinados padrões amplos: meu humor X a posição dos planetas do sistema solar; minha personalidade X a posição das estrelas na época do meu nascimento; minha colheita X sacrifício de virgens; a vitória do meu time X a cor da minha cueca.
Quando ultrapassamos esse limiar perigoso entre a observação de padrões e a crença, passamos a definir nossa existência a partir destes padrões, divinizamos essa percepção. E, ultrapassado este limiar entre correlação e acaso, quando os fatos passam a contradizer nossas crenças, elaboramos racionalizações engenhosas para reforçar os padrões metafísicos que concebemos em nossa mente.
As vezes, adicionamos alguma variável impossível de provar para eliminar todas as inconsistências (“Deus quis”, “Não podemos conhecer a vontade de Deus”, “É o destino”). Todo sistema de crenças baseia-se, em última instância, na interpretação limitada de eventos naturais, na visualização de padrões onde estes não existem e no preenchimento das lacunas de conhecimento com engenhosas fantasias impossíveis de comprovar. Nossas lacunas de conhecimento são um prato cheio para a superstição e a crendice.
O maior antídoto para a superstição é a busca honesta pelo conhecimento, o pensamento crítico. Nós engrandecemos, historicamente, a imagem do homem de fé, aquela pessoa habituada a jogar os dados no que se chama de “passo de fé” e que enaltece o acaso atribuindo a tudo o determinismo implacável da “vontade de Deus”. Quando tudo dá certo, “eis que um milagre aconteceu!” Quando tudo dá errado, “Deus sabe o que faz”. E com isso, ninguém aprende com a experiência, pois não há mais verdades a buscar.
Isso é pura e simplesmente desonestidade e indolência intelectual. Desonestidade, pois há um instinto de sufocar questionamentos dissonantes, que buscam outras explicações mais materiais para os humores divinos. Indolência, pois buscar o conhecimento requer trabalho árduo e muitos não querem dispor de seu tempo nessa busca.
É impossível provar materialmente e por métodos científicos a existência ou a inexistência do sobrenatural, portanto, do ponto de vista lógico e filosófico, esta questão continuará sendo uma questão em aberto. Mas, por outro lado, com o conhecimento atual, é possível encontrar explicações naturais para a maior parte de nossas experiências ditas “espirituais”.
E o que não podemos explicar, é muito mais provável que seja apenas uma questão de falta de conhecimento do que de magia e energias espirituais esotéricas. Basta olhar como o conhecimento científico ocupou gradualmente o espaço do sobrenatural ao longo da história humana. Provavelmente, é apenas uma questão de tempo para deixar o sobrenatural em maus lençóis.
A realidade é, por si só, repleta de desdobramentos fractais e padrões incompreensíveis e complexos. E sempre há um certo grau de aleatoriedade em tudo o que acontece. É difícil para nós, com nossa herança esotérica, aceitar a aleatoriedade e a naturalidade dos eventos de nossa vida.
Nossa mente, nossos olhos, nossos pensamentos estão longe de serem testemunhas confiáveis dos eventos naturais. Nossa mente é irremediavelmente suscetível à manipulação, à distorção, à reinterpretação da realidade. Nossa própria mente preenche lacunas, e somos capazes de ter absoluta certeza de algo que não é verdade, apenas pelos próprios mecanismos do nosso cérebro em preencher lacunas.
Por isso, não me contento com uma explicação barata que não explica nada. Busco o conhecimento em toda oportunidade. E humildemente, reconheço a insignificância de meu conhecimento frente a tudo o que pode ser conhecido.